O SOFRIMENTO DO BRASILEIRO NAS OLIMPÍADAS
Por Márcia Pires Brandão
Brasileiro gosta de torcer e o prazer aumenta quando o time ou a “estrela” é da casa. Gostaríamos de ver os nossos atletas no pódio recebendo não só medalhas de bronze, mas de prata e de ouro também. Não poucas, mas muitas. Na verdade, queríamos estar, pelo menos, entre os cinco primeiros colocados no ranking geral de medalhas.
Por isso, existe um murmúrio de decepção pelas “falhas” de nossos atletas. Claro que perdoamos, como brasileiros, mas temos desinteresse pelo oitavo, sétimo ou sexto lugar, mesmo que seja do planeta! Esquecemos as dificuldades que existem por trás dos nossos atletas olímpicos, principalmente se comparados com os dos países campeões.
Entre lá e cá
Nosso currículo escolar não valoriza o esporte. Os incentivos são raros e os patrocínios acontecem para as modalidades consagradas e, em geral, coletivas. Só depois que um atleta brasileiro desponta no cenário internacional, a modalidade esportiva ganha visibilidade. Mas até lá, como ele vive, treina, se dedica e se alimenta para competir? A trajetória do judoca Eduardo Santos, que fez sua estréia em Jogos Olímpicos na China é mais um exemplo. Ele não tinha sequer dinheiro para pagar o registro de faixa preta na Confederação Paulista.
A miscigenação de raças é um ponto a favor do Brasil. Possuímos as habilidades e as qualidades de diversas etnias, o que favorece a prática de vários tipos de esportes. Tal como os americanos, que contam com o mesmo privilégio, temos na mistura racial muitos talentos. A diferença está na falta de valoração da nossa educação esportiva. Enquanto os estudantes americanos são apresentados desde cedo a diversos esportes para se identificarem com algum, nós temos um vazio esportivo na formação escolar. Nem no handball, que faz parte do nosso currículo escolar, nos destacamos. Faltam estímulo e campeonatos entre as escolas.
A seleção de futuros atletas ao longo do treinamento escolar, como ocorre nos Estados Unidos, Cuba, China, e nos demais países campeões de olimpíadas, é inviável no Brasil, já que não temos essa estrutura educativa que permite a descoberta de talentos. Por isso, muitos dos nossos atletas são descobertos ao acaso, especialmente nos esportes individuais. Às vezes, até tardiamente, como Daiane dos Santos, aos 11 anos, que brincando numa praça, despertou a atenção de uma professora. Mas, na ginástica artística, por exemplo, o corpo deve ser modelado desde cedo, pois a preparação tardia traz maiores possibilidades de lesões.
A ginástica olímpica que deu um “salto” no Brasil depois de Danielle Hipólito e Daiane se destacarem, conta, hoje, com apenas dois centros de excelência para treinamento dos atletas. Um, no Clube Flamengo, (de onde saíram Danielle e seu irmão Diego) que só agora possui aparelhos de última geração recebidos do Pan 2007. O Centro de Treinamento de Curitiba é a outra opção. Lá, o atleta recebe todo o apoio técnico, escolar e financeiro para se dedicar ao treinamento.
Os atletas dos esportes individuais no Brasil precisam ser bancados pela família, o que é bastante difícil para a realidade do país. No atletismo, então, poucos conseguem despontar porque vêm de famílias pobres.
A preparação dos atletas chineses
Não é à toa que a China desponta como líder no quadro de medalhas olímpicas. Há dois ciclos olímpicos, o país vem preparando atletas. Uma estratégia iniciada em 2000, após os jogos de Sydney e turbinada em 2001, após o país ser escolhido para sediar os jogos de 2008, é a responsável pelo desempenho chinês em Pequim.
O governo investiu pesado em modalidades individuais como tiro, levantamento de peso, atletismo, etc. Contratou técnicos estrangeiros e exportou atletas chineses para jogar em times no exterior, visando a troca de experiências e tecnologias esportivas.
Como não havia dinheiro para construir instalações esportivas em todos os colégios, eles investiram em escolas esportivas. Em 2004, eram cerca de 400 mil estudantes matriculados em três mil escolas esportivas. Uma em oito crianças entra para um time da província e, uma, em cada três, para um time nacional, numa verdadeira pirâmide esportiva.
Por isso podemos dizer que ter atletas brasileiros “chegando lá” e até ganhando medalhas é uma demonstração de força que merece ser aplaudida. Em Atenas, o Brasil não conseguiu classificar a equipe para as finais da ginástica olímpica. A Daniele Hipólito ficou como a 12ª ginasta mais completa do mundo e a Daiane ficou em 5º lugar no solo.
Num ciclo de quatro anos, evoluímos. A equipe feminina de ginástica olímpica se classificou pela primeira vez nas finais, ocupando o 8º lugar. A Jade Barbosa e a Ana Paula Santos disputaram o individual geral. A Daiane, o solo. A Jade Barbosa, o salto sobre cavalo. Em outras modalidades esportivas também crescemos.
Queríamos mais? Claro que queríamos e poderíamos ter mais se houvesse políticas públicas, não ocasionais, mas planejadas de incentivo à educação esportiva. Além de ganharmos muitas medalhas pelas vitórias dos nossos atletas, teríamos, com certeza, a redução da violência, com a inclusão social.
OBS: Márcia pires Brandão é professora de Educação Física e Fisiologista do Exercício. Joga vôlei amador desde os 10 anos.
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